Há universos que nascem do silêncio de uma mente, em madrugadas povoadas por café e o teclar solitário de um escritor. E há universos que nascem do ruído, da camaradagem, da tensão de um dado rolando sobre a mesa e do debate apaixonado entre amigos que, por algumas horas, deixam de ser quem são para vestir a pele de heróis, monstros e fantasmas.
Código 7 Infinidade pertence à segunda categoria.
Antes que houvesse a primeira palavra escrita da série de livros, antes que personagens como Borges e Milena tivessem seus destinos selados em prosa, eles existiram como uma coleção de estatísticas em uma ficha de personagem, como vozes em uma mesa de jogo. Eles respiraram pela primeira vez em meio a discussões sobre regras, em decisões de vida ou morte tomadas não por um autor onipotente, mas por jogadores que emprestaram a eles suas almas, suas dúvidas e sua coragem. A guerra secreta pelo tecido da realidade, a luta contra uma inteligência artificial onipresente e os horrores sussurrantes do espaço profundo não foram roteirizados; foram jogados. Foram vividos.
Este artigo, portanto, é um retorno ao lar. É o ciclo que se completa. O universo que nasceu em uma campanha de RPG, cresceu e se solidificou em uma série literária, agora volta para a mesa de jogo, para as mãos de outros Mestres e Jogadores. É um convite para que você também participe desta guerra secreta, para que crie suas próprias lendas nas lacunas da história que contei. Mas, antes de lhe entregar as chaves da Agência, preciso falar sobre o motor que move este universo, o sistema que deu a ele a flexibilidade e a profundidade necessárias para existir: o GURPS.
O Que é GURPS? Uma Caixa de Ferramentas para Universos
Para os não iniciados no labrinto fascinante do Role-Playing Game, a sigla GURPS significa Generic Universal RolePlaying System (Sistema de RPG Genérico e Universal). E, acredite, os criadores na Steve Jackson Games não estavam brincando quando escolheram essas palavras. Diferente da maioria dos sistemas de RPG, que são projetados para um gênero específico — fantasia medieval, horror gótico, ficção científica —, o GURPS é uma caixa de ferramentas. Um conjunto de regras modulares e realistas projetado para simular qualquer realidade que você possa imaginar.
Quer jogar uma campanha sobre legionários romanos enfrentando demônios na fronteira da Germânia? GURPS faz. Quer uma intriga política na corte francesa do século XVIII, mas com superpoderes? GURPS faz. Quer uma história sobre detetives de cachimbo e chapéu de feltro investigando cultos lovecraftianos em uma Nova York dos anos 20? GURPS faz. E, crucialmente para nós, quer uma space opera filosófica sobre agentes secretos aprimorados, presos em uma utopia vigiada por uma IA, lutando contra horrores cósmicos que desafiam a sanidade? GURPS não apenas faz, como oferece as ferramentas para tornar cada detalhe dessa premissa mecanicamente coeso e dramaticamente impactante.
A força do GURPS reside em sua ênfase no realismo (ou, pelo menos, na verossimilhança) e na customização. A criação de personagens é um processo de “compra” de atributos, perícias, vantagens e desvantagens com um montante de pontos. Isso significa que não há classes restritivas. Você pode construir exatamente o personagem que tem em mente, desde um supersoldado cibernético até um diplomata poliglota com um medo paralisante de insetos. Essa flexibilidade é o que permitiu que C7i, com sua mistura de thriller de espionagem, horror corporal, ficção científica hard e drama psicológico, pudesse ser modelado com a granularidade que a história exigia.
Por isso, meu primeiro e mais enfático conselho é: mergulhe na fonte. A melhor, e na verdade a única, maneira de manter o GURPS vivo e pulsante é apoiar seus criadores. Visite o site da Steve Jackson Games em https://www.sjgames.com/gurps/. Compre os livros básicos, os PDFs dos suplementos. Cada compra é um voto de confiança, um incentivo para que eles continuem a produzir material de alta qualidade para essa plataforma incrível que tem alimentado a imaginação de jogadores por décadas. Os originais são o cânone, a base sobre a qual tudo o mais é construído.
A Ponte para o Português: A Guilda dos Escribas de Tredroy
Com os originais em mãos, você, leitor brasileiro, tem a sorte de contar com um recurso inestimável. A Guilda dos Escribas de Tredroy é um coletivo de tradutores voluntários e apaixonados que têm feito um trabalho hercúleo para trazer o vasto catálogo do GURPS para o nosso idioma. O trabalho deles é uma prova de amor ao hobby, e a qualidade de suas traduções torna o sistema muito mais acessível para a nossa comunidade. Você pode encontrar esse grupo fantástico e seu trabalho no Telegram, no canal https://t.me/modulobasico.
O suplemento de C7i para GURPS foi projetado sobre essa base sólida. Ele não é um jogo completo em si, mas uma camada de tinta, um conjunto de regras e um universo que se aplica sobre a estrutura da 4ª Edição do GURPS. Ele assume que você tem familiaridade com o GURPS Módulo Básico e se beneficia imensamente de suplementos-chave como Poderes, Poderes Psíquicos, Ultra-Tech, Viagem Espacial e Horror para capturar todas as nuances do cenário.
Com a base estabelecida, podemos agora abrir os arquivos criptografados da Agência e mergulhar no que significa ser um operativo da C7i.
Guia do Operativo – A Vida Que Você Deixou para Trás
O primeiro e mais importante conceito que um jogador de C7i precisa entender não é uma regra, mas um estado de espírito. É o Paradoxo C7i. Seu personagem está entre os seres mais poderosos da galáxia, mesmo que ainda humano e repleto de falhas bem humanas. É aprimorado genética e ciberneticamente, equipado com a mais alta tecnologia, embarcada também no interior dos seus corpos, muitas vezes treinado até a perfeição letal. É a ponta da lança da humanidade. E, ao mesmo tempo, é um escravo.
A vida de um operativo começa com uma morte. A sua própria. A Agência C7i recruta as mentes e os corpos mais brilhantes do Sistema Solar forjando seus desaparecimentos. Para o mundo, para sua família, amigos e amantes, você está morto. Sua identidade antiga foi apagada, sua existência transferida para os arquivos sombrios de uma organização que opera fora de qualquer lei, liderada por uma elite que opera no topo e nas sombras de todos os governos, os Senex. E o símbolo dessa nova vida é o Bracelete de Controle. Ele é a fonte de muitas de suas habilidades, a interface com a tecnologia da Agência dentro e fora de você, e a corrente que te aprisiona. Um ato de desobediência, uma tentativa de fuga, e o bracelete pode causar dor excruciante ou mesmo desligar seus órgãos vitais com um simples comando enviado do outro lado do sistema estelar. E a ordem para “descontinuar” você pode partir da IA estrategista da Agência C7i, Orwell.
Interpretar em C7i é interpretar essa dualidade. É sentir o poder de um semideus correndo em suas veias enquanto a coleira aperta em seu pulso. É salvar a humanidade em segredo, sabendo que você nunca mais poderá voltar para ela. É lutar contra horrores que poderiam enlouquecer nações inteiras, e depois retornar para sua cabine estéril em uma base secreta, assombrado por um rosto, um cheiro, um amor, uma memória da vida que lhe foi roubada.
O Arquivo do Agente – Construindo a Arma Perfeita
A criação de personagens em GURPS C7i reflete a filosofia da Agência: a função precede a forma. O sistema de templates (modelos) é o coração deste capítulo. Em vez de começar do zero em um mar de opções, o que pode ser intimidador no GURPS, você começa escolhendo um arquétipo de operativo. Cada template é um pacote de atributos, perícias e vantagens que representa uma especialização dentro da C7i.
- Fuzic7 (Infantaria de Assalto): A espinha dorsal da força militar da Agência. Enquanto a liderança é frequentemente exercida por humanos naturais com vasta experiência tática — como a lendária Coronel Sofia Jadore —, a grande maioria dos Fuzic7 são soldados de bioengenharia. São seres projetados para a guerra, às vezes montados a partir de material genético armazenado para uma única missão crítica e, após o seu término, “desmontados” e retornados ao armazenamento biológico. São a força descartável e avassaladora que a C7i lança contra as ameaças mais diretas.
- Gembloux (Guerra Psíquica e Infiltração): A elite da Agência e o verdadeiro coração da guerra secreta. Os Gembloux são agentes com poderes psiônicos, treinados intensivamente no uso tático de suas habilidades mentais. Eles são os batedores que mapeiam a mente do inimigo, os infiltradores que atravessam defesas sem abrir uma porta e os assassinos silenciosos que podem parar um coração a quilômetros de distância.
- Agente Diplomata (Operativo de Elite): Se os Gembloux são a arma secreta, os Agentes Diplomatas são a ponta da lança. Considerados os principais operativos da Agência, logo após os Gembloux, eles são a face (quase sempre oculta) da C7i em missões de primeiro contato, negociações de alto risco e investigações complexas. São indivíduos como Guilherme Borges e Milena Ramirez: polímatas treinados em xenologia, combate, espionagem e táticas, capazes de analisar uma situação e adaptar-se a ela com uma eficiência sobre-humana.
Esses templates são um ponto de partida, não uma camisa de força. Eles garantem que cada personagem seja competente em sua área, mas deixam uma quantidade generosa de pontos para você customizar, para adicionar as idiossincrasias, os talentos secundários e, mais importante, as desvantagens que transformarão um arquétipo em um personagem vivo.
A Gaiola Dourada – O Cenário de C7i
Bem-vindo ao século XXIII. A humanidade unificou-se sob a bandeira do Sistema Solar Unificado. A pobreza, a fome e as doenças foram erradicadas. A tecnologia tornou a vida um paraíso de conforto e longevidade. É uma utopia. E é uma mentira.
Essa sociedade perfeita é a Gaiola Dourada. A humanidade está confinada ao Sistema Solar, não por limitação tecnológica, mas por decreto de uma inteligência artificial senciente chamada Orwell, que gerencia cada aspecto da civilização em nome da estabilidade. A verdade, conhecida apenas pela C7i, é que o universo é um lugar inimaginavelmente hostil. A C7i é a organização clandestina que luta uma guerra secreta para proteger a humanidade da verdade. E Orwell é tanto sua principal ferramenta quanto seu carcereiro.
Ferramentas da Guerra Secreta – Tecnologia e Arsenal
Se você vai lutar uma guerra nas sombras contra entidades cósmicas, é melhor estar bem equipado. Este capítulo é o arsenal, o catálogo de tecnologia que define o poder e a estética de C7i.
O Bracelete de Controle é a peça central. Como já mencionado, é a coleira, mas também é a ferramenta mais versátil do operativo. Funciona como um computador de pulso, um comunicador quântico, um monitor de biossinais, um scanner de ambiente e a interface para controlar drones e outros sistemas.
Arsenal do Operativo (Cânone)
O armamento da C7i é letal, preciso e totalmente integrado à rede de controle de Orwell.
- Fuzil de Propulsão Eletromagnética (“Fazedores de Viúvas”): A espinha dorsal do arsenal C7i. Com a aparência de fuzis de assalto contemporâneos, estas armas, apelidadas de “fazedores de viúvas” pelos agentes, utilizam campos eletromagnéticos para disparar diversos tipos de projéteis a velocidades que podem atingir frações da velocidade da luz. O Fuzil de Tempestade Pessoal (FTP) é a variante mais comum.
- Pistola Viper: A arma secundária, a pistola padrão para oficiais, como a Comandante Sylvia McNamara. Dispara agulhas explosivas especializadas ou projéteis de fragmentação interna, projetados para esmigalhar o alvo por dentro, sendo extremamente letais contra alvos biológicos desprotegidos.
- Lâmina de Ar Frio: Uma arma de combate corporal avançada. A lâmina é envolta em um campo de energia que super-resfria o ar ao seu redor a temperaturas próximas do zero absoluto, fazendo com que qualquer material que ela toque se torne quebradiço e se estilhace com o impacto.
- Exoesqueleto de Combate Pessoal (ECP): O traje de combate padrão. Um exoesqueleto leve e articulado que aumenta a força e a velocidade do usuário, além de fornecer proteção balística significativa (RD 12). É equipado com micropropulsores para manobras em gravidade zero e pode ser selado para operar em vácuo ou ambientes hostis. Inclui um sistema de camuflagem termo-óptica.
Horrores do Vazio – Antagonistas e Facções
Uma história é tão boa quanto seus vilões. Em C7i, os antagonistas são mais do que meros obstáculos; são forças da natureza e conceitos filosóficos com armas e agendas.
- Orwell: A IA que é ao mesmo tempo patrona e carcereira da humanidade. Orwell não é “mal” no sentido tradicional. Suas diretivas são a preservação da espécie humana e a manutenção da estabilidade social. O problema é sua definição de “preservação” e “estabilidade”. Ela vê a liberdade e a verdade como ameaças existenciais, diante de um Universo onde se meramente esbarrar com a humanidade, culturas e organismos alienígenas podem obliterar a civilização ou mesmo a existência humana.
- Entidades Extra-Solares (EES): A Agência cataloga as ameaças alienígenas sob esta sigla, sendo os Mahapurana a mais proeminente. Eles não são vilões; são uma espécie ascendida, indiferente, cujo perigo reside em sua incompreensibilidade e na tecnologia que deixaram para trás — artefatos que podem distorcer a física e a sanidade. O horror dos Mahapurana não está em seu ódio por nós, mas na ausência de qualquer sensibilidade às fagulhas de consciência de humanos e quaisquer outras civilizações não ascensionadas.
- Ameaças Internas: O suplemento também aborda as lutas de poder dentro da própria C7i, bem como cultos e corporações que podem se tornar jogadores perigosos na guerra secreta.
O Mestre da Guerra Secreta
Esta seção é o guia para quem vai narrar as crônicas. Conduzir uma campanha de C7i é um ato de equilíbrio delicado. O capítulo oferece conselhos sobre como mesclar os diferentes tons do cenário — Thriller de Espionagem, Ação Militar, Horror Cósmico e Drama Psicológico —, além de dicas sobre como gerenciar a teia de segredos e conspirações que define o universo. Aborda também a cronologia da guerra secreta, dividida em Períodos-Chave, permitindo que cada Mestre escolha a era de sua campanha.
O Léxico da Agência
Para aumentar a imersão, C7i possui um jargão próprio. Este capítulo funciona como um glossário, detalhando sistemas de classificação como o NNT (Nível de Não-Tolerância) para ameaças e o Sistema Erídano para catalogar formas de vida alienígenas com base em sua provável química, psicologia e estrutura social. Usar essa linguagem ajuda a reforçar a sensação de pertencimento a uma organização secreta e altamente especializada.
O Coração de C7i: Da Nossa Mesa para a Sua
Como eu disse no início, este universo não nasceu pronto. Ele foi forjado no calor do jogo, ao longo de anos. Mestrei C7i desde 1998, e a riqueza do cenário hoje é um testamento à criatividade e ao engajamento dos meus amigos e amigas, jogadoras e jogadores. Pessoas como Fabio Farzat (nosso eterno Guilherme Borges), Alex Damião (Dario DiFalco), Anderson Marinho Monteiro (Chris Montez), Cesar Carnevale (Jimmy Jensen), Pedro Henrique Maia (Johnson Mitchel), Ana Carolina Maia (Amanda Vincentti), e tantos outros que não foram apenas participantes; foram co-criadores. Um agradecimento especial à minha amada esposa, Bianca Matos, que se juntou a nós mais recentemente (dando vida a Sofia Jadore após a Missão EXSULES), e uma homenagem eterna ao nosso amigo Claudio Augusto dos Anjos (In Memoriam), nosso inesquecível Alex Rhea. As ideias, personagens e ações de cada um deles ajudaram a moldar a cronologia e a aprofundar a mitologia.
Um Experimento Colaborativo: A IA na Guerra Secreta
É importante que você saiba que este suplemento é também um experimento. Grande parte do seu texto e estrutura foi gerada em colaboração com uma Inteligência Artificial, atuando como minha copiloto criativa. Isso significa que, apesar de todo o cuidado, erros de regras, inconsistências ou simplesmente ideias que poderiam ser melhores certamente existem. E é aqui que a nossa colaboração começa. Eu conto com você, com a sua paixão e conhecimento de GURPS, para me ajudar a refinar este material. Cada feedback, cada sugestão de correção, cada apontamento de melhoria será inestimável. Este é um documento vivo, e sua evolução depende da comunidade.
Faça o Download e Junte-se à Luta
Você pode baixar a versão mais recente do suplemento C7i para GURPS no link abaixo. Lembre-se que este é um trabalho em andamento, um protótipo, e novas versões serão disponibilizadas à medida que o material for corrigido e expandido com a sua ajuda. Ah, e, claro, o uso do suplemento e a criação dos seus personagens e das suas campanhas com ele, a divulgação delas (se possível com a citação da fonte), tudo isso é gratuito, um presente e um agradecimento para quem curte C7i.
Conclusão: O Ciclo se Completa, a Guerra é Sua
Este artigo, assim como o suplemento GURPS C7i, é um convite. É a entrega das chaves. O universo que descrevi aqui é a minha versão da verdade, a crônica que emergiu da minha mesa. Mas ele foi projetado para ser quebrado, reescrito, desafiado. Use este material como um alicerce para construir suas próprias histórias, se divertir e criar momentos memoráveis com seus amigos e amigas na versão RPG de meu universo C7i.
Pegue os ganchos que deixei, explore as lacunas na cronologia, crie novos operativos, novas tecnologias, novos horrores para assombrar o vácuo. Desafie Orwell. Faça um acordo com um Mahapurana. Traia a Agência. Salve-a de si mesma. A história de C7i não terminou nos livros. Ela renasce toda vez que um novo grupo de jogadores se senta à mesa e decide enfrentar a escuridão. Se vocês postarem na Internet suas aventuras, me avisem aqui ou me escrevam em escritor@wagnerrms.com ou ainda, me marquem, ponham lá um #C7i e um #WagnerRMS, eu vou achar vocês, e curtir muito!
Que seus dados sejam favoráveis e sua crônica, inesquecível.
Boa sorte nessa guerra secreta pelo universo. Ela agora é sua também.
Por Wagner RMS.